quarta-feira, 21 de maio de 2008

Cantos das Cidades 4 - O lobisomem que mora ao lado (DF)


A banda brasiliense Bois de Gerião, na canção “Meu vizinho”, canta o seguinte trecho "Prazer em conhecê-lo, caro amigo. Moro ao seu lado. Divido paredes contigo." Como o Bois é uma das bandas que mais curto atualmente, decidi incluí-lo no livro Cantos das Cidades. Dessa forma, eu já tinha um ponto de partida para escrever um conto ambientado em Brasília.

Mas o que dizer nesse conto? Que história esse vizinho brasiliense poderia inspirar? A resposta estava num outro trecho da música em que a letra diz “Pois saiba que por trás de todo médico existe um monstro. Eu sei fingir muito bem e por isso não demonstro.” Era isso. Para criar um conto legal eu poderia falar de um vizinho que fosse um tanto estranho, monstruoso. E para fazer isso bastou olhar ao redor e lembrar que existe um cara muito estranho que mora perto de mim.

O nome dele é Fêfo e ele é... Bem, ele é um lobisomem. (sobe BG).

Agora fiquem com um trecho do conto “O lobisomem que mora ao lado”.


“... Nessas noites, ele se transforma em lobisomem e fica lá, sendo um lobisomem, fazendo exatamente aquilo que nós, que não somos lobisomens, não fazemos.

Ter um vizinho lobisomem não é tão estranho quanto parece e até que não incomoda muito. Estranho mesmo seria ter um vizinho trompetista da marinha que ficasse lá soprando o instrumento dia após dia para nossa eterna agonia. Ainda mais se esse vizinho fosse fã incondicional de “Casablanca” e insistisse em repetir incessantemente “As time goes by” e mais ainda se a outra música que ele soubesse tocar fosse a da 7ª cavalaria e todas as manhãs você fosse despertado em meio a um susto danado com a sensação de um iminente ataque de índios americanos. Nessas horas, garanto, você preferiria ter alguém uivando na casa ao lado. ...”

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Texto Silencioso (Enjoy the silence 3)

Publicado na Diginet
www.diginet.com.br

A coluna de hoje é em homenagem a todos aqueles que sabem dar valor ao silêncio, que percebem quando calar é melhor que falar, que enxergam a expressividade dos olhares, a grandeza dos gestos, que não caem na fácil armadilha verborrágica, que conseguem a proeza de bastar-se por instantes que seja.

Hoje quero direcionar a luz para essas abnegadas almas, humildes em sua renúncia por atenção alheia, generosas em nos permitir contemplar o mundo sem maiores ruídos, sem a obrigação de ouvir o que não queremos, o que não pedimos, o que não precisamos.

Um texto dedicado aos tímidos, aos intimistas, aos introspectivos. Aos seres evoluídos que não se deixam trair pelo vazio das palavras soltas, desconexas. Homens e mulheres que só se manifestam quando têm algo de edificante a ser dito, algo que acrescente ao mundo e aos outros.

Quero chamar a atenção e apontar os poucos privilegiados na multidão de falastrões que nossa sociedade narcísea e carente produziu. Vou dar meus parabéns a todos os não adeptos do auto-elogio deliberado, à crítica cáustica e gratuita. Expressarei meu muito obrigado aos que nunca me perguntaram quais são as novas ou comentaram como está o clima. Nós, os silenciosos, não gostamos de meteorologistas de elevador e nem de saber se fulana está mais gorda. Acredite: isso não vai mudar nada.

Eu quero produzir uma ode ao inaudível, à harmonia presente na ausência de sons, aos últimos pacifistas, aqueles que realmente deixam os outros em paz.

É que palavras erradas, verbalizadas em momento impróprio podem ferir, quebrar o precioso silêncio de nosso pequeno mundo de paz. Palavras são imperfeitas e desnecessárias frente a sentimentos tão intensos.

Este texto é para todos aqueles que sorriem em silêncio.

Enjoy the silence 2



Um cover do Depeche Mode feito pelo Keane.
Enjoy. :-)

Enjoy the silence

Words like violence
Break the silence
Come crashing in
Into my little world
Painful to me
Pierce right through me
Cant you understand
Oh my little girl

All I ever wanted
All I ever needed
Is here in my arms
Words are very unnecessary
They can only do harm

Vows are spoken
To be broken
Feelings are intense
Words are trivial
Pleasures remain
So does the pain
Words are meaningless
And forgettable

All I ever wanted
All I ever needed
Is here in my arms
Words are very unnecessary
They can only do harm

Enjoy the silence

Enjoy the silence.

Há pouquíssimas coisas tão valiosas para mim quanto o silêncio. Aproveitar o momento de ausência de ruídos, saber calar quando necessário, curtir a solidão edificante que permite a reflexão, ler, escrever, ouvir, crescer, evoluir. Tudo isso é melhor praticado por quem sabe o real valor que o silêncio tem.

Hoje eu acordei com vontade de escrever sobre o silêncio e é possível que minha coluna da Digi seja a esse respeito.

Para ilustrar esse post, um comercial da Sony Ericsson que utiliza a música "Enjoy the silence" do Depeche Mode. Um dos comerciais mais legais que vi esse ano. Conheci o vídeo através do Brainstorm 9 (www.brainstorm9.com.br) e alguns acreditam que ele seja meio pra baixo ou que glamourize o isolamento social, mas não acho que seja o caso. Quem sabe valorizar devidamente o silêncio sabe do que a que o filme se refere. O arremate do reclame é sensacional: "A mais descompromissada experiência musical."


terça-feira, 13 de maio de 2008

PodSEX MTV - As mulheres falando de sexo



O que será que as mulheres falam sobre os homens quando estão sozinhas? Será que elas comentam sobre os tamanhos dos paus, nosso desempenho? Será que elas nos compram com outros caras e contam pras amigas como foi a noite anterior?

O site da MTV estreou essa semana um Podcast que esclaresce muita coisa. Capitaneado pela VJ Elisa Martinez, o arquivo traz 3 garotas conversando francamente sobre sexo, homens, paus e outros sub-temas relacionados.

O bate-papo traz algumas pérolas e expressões engraçadíssimas como o "pau-flecha", o queijo ricota acumulado nas "cabeças" e várias outras.

Quem quiser conferir, acesse o link http://mtv.uol.com.br/blogosfera/podcast/play/23331

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Ponta Negra Bulls

Publicada na Diginet
www.diginet.com.br

A jornalista Diana Medeiros informa por e-mail desde São Paulo, onde mora, que foi fundado o primeiro time de futebol americano do Rio Grande do Norte, o Ponta Negra Bulls. Eu, como potiguar, natalense e morador de Ponta Negra, tenho por dever cívico saudar os meus abnegados vizinhos, apaixonados pelo esporte estadosunidense e declarar desde já minha adesão à torcida dos Bulls (Go, Bulls!). Outro jornalista de nobre estirpe, o excelentíssimo Paulo Celestino, também apurou o fato e me enviou diversas reflexões sobre as possíveis conseqüências desencadeadas pelo eventual sucesso do esporte por essas bandas.

Abre aspas para Paulo Celestino:

“Tô até imaginando a final da NFL especial em Natal no Frasqueirão. As manchetes: Natal vai parar!!! E eu só tô esperando as gostosas Cheerleaders com aqueles pompons de um lado para o outro. Lanço a votação: qual será a trilha sonora delas? Babado Novo?”“A ED, além de fornecer meninas casadeiras prendadas para a sociedade, que sabem para que servem aquele monte de garfo e faca em cima da mesa e fazer bolo de chocolate, também será uma ótima provedora de cheerleaders.”

“Na minha ronda internética, descobri que times de futebol americano no Brasil são mais comuns do que se imagina. É superteindêiiincia! Se alguém achar o Ponta Negra Bulls absurdo, imagina o Cuiabá Arsenal. Fudeu geral! Natal ainda tem desculpa da presença americana na Segunda Guerra Mundial. Mas e Cuiabá? Só falta dizer que o Paraguai tem um dos melhores times de futebol americano da América Latina. E La garantia?...Soy yo!”

“A pergunta que não quer calar: América e ABC correrão para montar os seus times de futebol americano? O Alecrim ressurgirá das cinzas com o seu plantel afiado para fazer touchdowns e aqueles montinhos de macho uns em cima dos outros? E os colégios hein? Imagina o Jern´s: Objetivo X CEFET na praia do meio. Um clássico.”

“Ah, e imagina os mascotes...Calangos, Pebas, etc. Será no mínimo, interessante.”

“Pelas pesquisas virtuais que fiz, percebi que, infelizmente o Ponta Negra Bulls não está listado nos times de futebol americano brasileiros. Acho que vai ter que engordar umas arrobinhas mais.”

“Tô até vendo também o uso político da coisa. Os governantes vão mandar construir um estádio. Na campanha vão dizer que gera empregos, o novo aeroporto vai servir para receber as hordas - ops, os times - americanos. E é o desenvolvimento chegando ao Rio Grande do Norte. Vai ter candidato prometendo construir uma ponte até Miami para "unir os povos". Afinal, Natal é uma cidade de todos. Que o digam os portugueses, espanhóis e escandinavos, etc...”

“E se a moda pega no Estado? Caicó Yankees (originalmente é de Baseball, mas em Caicó vai ser de Futebol Americano), Mossoró Lampião Patriots, Japecanga Socks (também originalmente de Baseball), Passa e Fica Demolitors, Parnamirim Jets, Redinha Saints, Macaíba Broncos, Panatis Steelers, Ceará-Mirim Packers (gente, é sério nos EUA tem o Green Bay Packers), Currais Novos Cowboys e o Pipa Dolphins. Detalhe: todos vão usar aqueles uniformes e capacetes naquele calor do cão.”

“Os 500 escandinavos que moram em Natal já estão pleiteando entrar na liga. Será o Escandinavos Vikings.”

“Tadeu Schmidt vai fazer piadinha engraçada no Fantástico e o Batendo Perna vai cobrir todos os babados dos jogadores no Carnatal.”

“Continuando minhas pesquisas, descobri que existe a ANEFA - Associação Nordestina de Futebol Americano. Consta no site: (abre aspas) Tendo em vista os objetivos e idéias de praticantes do FA (FA é Futebol Americano - nota do editor) no nordeste a criação da associação se fez necessária para centralizarmos informações sobre tais objetivos. A formalização da associação virá com o tempo. (Fecha aspas). A ANEFA anda meio em baixa. No fórum de discussões do Yahoo, neste ano ainda não tiveram mais do que 7 mensagens. No ano da sua criação, em 2006, só em novembro foram 80.”

Bem, meus caríssimos leitores, como vocês puderam perceber, esta semana eu tirei folga e a coluna foi toda escrita pelo amigo Paulo Celestino que, mesmo de longe, fez ótimas e preciosas observações sobre esse novo e empolgante acontecimento. Eu, aqui de Natal, direto do Conjunto Ponta Negra, faço votos de longa vida a esta recém surgida agremiação e me despeço de vocês com o grito de guerra do Ponta Negra Bulls Ladies, a versão feminina dos Bulls:

Nossa instiga é? Jogar!
Nosso garra é? Vencer!
Nosso lema é? Destruir!
Somos? Bulls!
Somos? Ladies!
Somos? Ponta Negra Bulls Ladies!
Jogar,vencer,destruir... Ladies,Ladies,Ladies!
CRÉÉÉÉUUU!

Sério: eu já tenho um time do coração. E vocês?

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Cantos das cidades 3 - Teorias e conspirações (BA)



Gilberto Gil canta que a Bahia já lhe deu régua e compasso. Eu poderia dizer que ela me deu subsídios para escrever o segundo conto de Cantos das cidades. E nem precisou de muito. Bastou uma única frase: "Eu não preciso ler jornais. Mentir sozinho, sou capaz." do baiano Raul Seixas. A partir dela, nasceu o conto "Teorias e conspirações" que contou com a co-autoria da advogada Rafaela Lopes. Abaixo, postei um trecho:


"Murilo não acreditava em teorias da conspiração. Para ele, as teorias da conspiração não passavam de conspirações para se fazer acreditar nas teorias. Era uma posição sensata para um jornalista competente formado pela UFBA. Para ele John Kennedy foi mesmo morto por Lee Harvey Oswald; Juscelino foi vítima de um acidente de carro; Jango, uma fatalidade; Jimmy Hendrix, Janis Joplin, Jim Morisson e Elvis? Tudo overdose; PC Farias, crime passional; ET de Varginha e Chupa Cabras? Por favor não me façam rir; Caso Roswell, CASO O QUE?!"


O protagonista do conto é uma homenagem a um grande amigo soteropolitano, Murilo Souza e a história brinca com as lendas urbanas nossas de cada dia.


terça-feira, 6 de maio de 2008

Entrevista



Ontem concedi uma entrevista para o jornalista Alex de Souza na TV Assembléia. Muito boa devido à pertinência das perguntas feitas pelo jornalista. Alex conversou sobre os novos projetos do selo Jovens Escribas, os lançamentos de "O Dia das Moscas" e "Os Poetas Elétricos", Lei do Livro, mercado editorial potiguar e, o melhor, não recorreu a óbvia e enfadonha pergunta: "Como foi que surgiu os Jovens Escribas?" que eu já não tenho saco de responder.


E para embelezar esse post, ilustrei uma foto do grande Alex de Souza.


Admirável Cidade Nova

Publicado na Diginet
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“Pensar enlouquece!” é o que devem pensar alguns (na verdade, muitos) conterrâneos. Por isso, é bom se adaptar e seguir o fluxo, fazendo sempre o que determina o sistema, a sociedade, a moda, os outros. É essa gente bronzeada e lobotomizada sem mostrar nenhum valor, ingereindo o Soma da mesmice, dia após dia. Por que experimentar o novo? Por que procurar saber? Favor, dirija-se ao outro guichê!
Essa premissa torna a cidade estranhamente assemelhada a certos clássicos literários que retratam um futuro sombrio e ameaçador, dando ares de terra arrasada, de completa devastação e revelando frouxos princípios morais.
O lugar agora se divide em diversas zonas: a Zona Norte, onde se concentra grande parte das castas inferiores; a Zona Sul, onde residem as castas superiores, favorecidas pelo sistema; os subúrbios emergentes como Nova Parnamirim e Cidade Verde; e as curiosas Zonas Aristocráticas com indesejáveis bolsões de pobreza incrustrados, como Areia Preta e Mãe Luíza.
A população de 800 mil seres humanos é formada por castas de características diferentes, manipuladas pela lógica do Capitalismo Tropical. Nos gabinetes e altos escritórios empresariais são definidos os pouco dotados de recursos, destinados aos rigores do trabalho braçal, ao sub-emprego, à pobreza. A eles não é dado acesso à boa educação, assistência social, saúde. Geralmente são pardos, alguns negros, quase sempre fora dos padrões de beleza estabelecidos. A aparência é importante, imprescindível, determinante até. Forma é conteúdo.
Os gabinetes e altos escritórios empresariais também decidem os que crescem para comandar. Ricos, bonitos, de pele clara, bem apessoados e asseados, exibindo sorrisos brancos e brilhantes. As castas inferiores não têm qualquer poder de decisão, mas são levadas a acreditar que escolhem os comandantes. Não passam de massa de manobra.
Não há espaço para a surpresa, para o imprevisto. O diferente não é tolerado. Fugir dos padrões, quebrar paradigmas, romper com o pré-estabelecido constitui crime gravíssimo, inafiançável, passível de punições severas, olhares reprovadores, isolamento forçado.
Estamos no ano 60 depois de Bel. O pensamento é proibido e a mediocridade amplamente estimulada e praticada. O intelecto, a erudição, a alta cultura são sufocados com refrões barulhentos e repetitivos com extrema virulência e incrível eficiência. Aprender coisas novas, acostumar-se com letras desconhecidas, melodias estranhas, livros, filmes minimamente inteligentes, palavras polissilábicas demais podem causar estafa, exigindo tamanho empenho das sinapses neuronais que acabam por provocar aneurisma devido ao pouco uso. Que fiquemos com as músicas cheias de vogais e as familiares canções oitentistas que já conhecemos há quase 30 anos.
A lei do menor esforço mental impera na cidade. A disciplina e a perfeita ordem com que os cidadãos cumprem seus desígnios tornam sua realidade admirável. Somos todos treinados para viver assim, condicionados à satisfação, à felicidade, conduzidos a amar o que somos obrigados a fazer. A cidade agora se chama Nova Utopia e o futuro sombrio, tão temido no passado, encontrou lugar no presente.
“O segredo da felicidade e da virtude é amarmos aquilo que somos obrigados a fazer.”Aldous Huxley – Admirável Mundo Novo

segunda-feira, 5 de maio de 2008

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Cantos das Cidades 2 – Pelejas (RS)




O primeiro conto de “Cantos das Cidades” a ficar pronto se passa em Porto Alegre (RS) e se baseia na seguinte frase: “Fidel e Pinochet tiram sarro de você que não faz nada.” Como vocês devem ter notado, trata-se de um trecho da canção “Toda forma de poder” dos Engenheiros do Havaí. O co-autor do conto foi o gaúcho Glauco Gobbato, torcedor do Internacional, produtor de bandas, gerente de bar e agora escritor.
Abaixo segue um pouco do conto, batizado de “Pelejas” para degustação.

- Do meu lado? Essa é boa! Daqui a pouco tu vais dizer que a culpa é minha pelas barbaridades que ele está aprontando!
- A culpa é tua sim! Tua e de todos os que apóiam uma postura retrógrada, voltada contra os interesses da coletividade. São essas coisas que atrasam esse país.
- Quer dizer que tu achas mesmo que governante pra ser bom, tem que ser de esquerda?
- Claro. A esquerda, meu caro primo, é que é capaz de promover um governo voltado para o povo. A direita só produz tiranos e elitistas. Nós temos Fidel, vocês Pinochet!
- Fidel mantém seu governo à base de torturas e assassinatos políticos, seu mongolão!

Que papelão, hein, Sr. Fenômeno?



O cara é rico, famoso, bem sucedido. Enfim, pode ter a mulher que quiser, na hora em que quiser e cai numa arapuca dessas. Levou 3 travecos pro motel e virou piada nacional.

Pelo menos rendeu esse anúncio aí do Lenílson Lima da Art&C.



A decadência é azul

Publicado na Diginet
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A vida se esvaindo entre os dedos, o tempo passando lentamente, os goles ávidos e vigorosos, pretensos catalisadores do tempo, supostos aceleradores do relógio, inúteis analgésicos da alma. Paliativos insignificantes para sintomas odiosos.

Todo dia é dia, quanto mais cedo, melhor. Antes das 9 da manhã, o uísque já desce macio, goela abaixo, corpo adentro. Empreendem uma fuga alucinada em direção a lugar nenhum. Os olhos vagueiam e já não enxergam horizontes, de expressão vazia, contemplam o nada que toma conta de seus dias.

A existência embebida em álcool recebe um componente extra de melancolia, corrosivo e explosivo ao mesmo tempo, que comprime as mentes ociosas, começando por eliminar qualquer indício de projetos futuros e terminando por fulminar os derradeiros resquícios de perspectivas. Os homens criam uma película isoladora cada vez mais espessa e se afastam de tudo aquilo que os define, que determina o que e quem eles são: família, amigos, hábitos e costumes. Tornam-se arremedos de si mesmos, atormentados por fantasmas de um futuro que nunca vem, jamais chega e, se vier, não traz nada de animador.

Passando pelas calçadas do bar, vejo aqueles distintos senhores mergulharem voluntariamente num poço sem fundo, vitimando a dignidade, desistindo de viver. Suicídio em conta-gotas e em goles sem conta, alegoria do fim que se aproxima, implacável, avassalador.

As paredes azuis são da cor da tristeza, dando o tom dos sentimentos liquefeitos, adornando o ambiente, esta mórbida sala de espera. E os senhores, consumidos pelos dias, desgastados, acabados, aguardam. Esperam a morte chegar, sem perceber que ela já os alcançou. Azul é a cor da vida que não é vida. Azul é a cor dos espectros de homens que já não são. Azul é a cor daqueles que já não existem mais.